Para todos os adultos, o conhecimento é extremamente importante. Para alguns, falta oportunidade, mas essa realidade tem mudado
Você faria sua terceira faculdade aos 70 anos? Ou começaria do zero aos 40? Vontade de estudar. Essa frase faz parte da vida de duas mulheres que o Jornal Sul conheceu. Elas escolheram seguir o caminho do conhecimento e, por essa razão, ultrapassam obstáculos dia após dia.
As salas de aula ficaram para trás quando ela ainda era muito jovem. Hoje, aos 43 anos, Raquel do Nascimento deixou a vergonha de lado e voltou a estudar. Com as coisas ficando difíceis, o trabalho de diarista que ela sempre exerceu agora só é aceito com ensino fundamental completo. Assim, ela escolheu seguir esse novo caminho, onde o instrumento principal de seus dias é o caderno nas mãos. “Tá sendo bem bom. Tô gostando bastante. Fazendo amizades e aprendendo bastante também. Hoje, sem estudo, a gente não consegue mais nada. Não consegue nem trabalhar de faxina”, comenta a aluna.
O EJA como uma segunda chance para adultos
Matriculada no Centro de Educação de Jovens e Adultos de Tubarão (CEJA) desde o início do ano passado e, dessa forma, ela é uma dos oitocentos alunos que passam diariamente por lá. A Educação de Jovens e Adultos (EJA) é uma modalidade de ensino criada pelo governo que auxilia nos estudos de quem não teve acesso à educação na idade apropriada. “A EJA surgiu como um projeto para atender uma demanda que existia. Hoje, ela já é considerada educação básica dentro da legislação”, afirma a assessora de Direção do CEJA de Tubarão, Jovania Maria de Souza.
De acordo com a assessora, a procura por emprego é um dos motivos para a volta desses alunos. “Alguns o mercado cobrou. Hoje, os nossos alunos com 30, 40 anos, saíram na época porque precisaram abandonar a escola pra trabalhar, pra ajudar a família. Afinal, há algum tempo não existia uma legislação que cobrasse que o adolescente estivesse na escola. Eu vi vários colegas meus abandonarem a escola após os 12 e 13 anos com o objetivo de trabalhar. Então, aos poucos, esse estudante retorna porque o mercado de trabalho exige”, conta ela.
Adultos já são mais presentes na busca pela educação
Essa mudança no cenário escolar e universitário, de acordo com os dados do IBGE, multiplicou por 4 nos últimos 10 anos. Estudantes com mais de 30 anos, que antes eram 2% das salas de aula do Brasil, hoje já são 10 e esse número tende a crescer. Dentro desta estatística está Maria da Gloria Schmall, que é daquelas que, apesar de tudo, não para de estudar nem por um segundo. Aos 70 anos, ela esbanja vontade de conhecer um pouco de tudo.
Como resultado, ela acumula uma graduação em antropologia, pós em bioética e, atualmente, cursando psicologia ela garante que seu espaço é bem respeitado. “Na época que eu entrei na UNB (Universidade de Brasília), mais jovem, se entrasse uma pessoa da minha geração numa turma eles olhariam com muito mais estranheza do que os jovens me veem dentro da sala de aula hoje, sendo uma pessoa de outra geração. Os jovens dessa geração, que são meus colegas na Unisul, eles são mais abertos, são mais ‘lights’. Eles sentam do lado, discutem. Então não causa estranheza eu ser uma pessoa de uma outra geração”.
Contudo, a conclusão é simples: aprendizado é sempre importante. Seja com 20 ou 50 anos. Depois de conhecer essas duas, bem como a sede delas em querer aprender, eu só tenho uma pergunta para fazer: quem é que disse que existe idade certa para o saber? Maria da Gloria responde. “Eu citaria um autor, teórico da psicologia do desenvolvimento da educação, Henri Wallon, que diz que o processo de aprendizagem é vitalício. Enquanto nós estamos vivos, nós estamos aprendendo”.
Leia mais: Acadêmicos e a saúde mental na universidade