Motoristas de Uber no sul de Santa Catarina

Uber é um aplicativo de transporte urbano privado, fundado em 2009 nos Estados Unidos. Chegou ao Brasil em 2014, primeiro no Rio de Janeiro e logo após em São Paulo. Passou por diversos problemas judiciais, envolvendo as companhias de táxi e afins, sendo suspenso diversas vezes até ser regularizado. O Brasil é o segundo maior mercado da Uber, perdendo apenas para os Estados Unidos.

A Uber é uma empresa com um histórico machista. Diversos funcionários e executivos de alto cargo já foram demitidos por problemas envolvendo machismo. O próprio fundador, o americano Travis Kalanick, renunciou à presidência da empresa em 2017, após ser criticado por declarações machistas. Além de algumas campanhas de marketing sexistas, como uma que aconteceu em Lyon, na França, em que uma promoção juntava passageiros com “motoristas gostosas”.

A postura da empresa quanto a casos polêmicos sempre gerou controvérsia. Para Marleide Martins, que tem 59 anos e foi a primeira mulher motorista de Uber em Criciúma, Santa Catarina, isso é um problema grave. Ela diz que “a Uber não passa informações sobre as viagens e os motoristas, a empresa deveria agir mais pela segurança dos motoristas, estar mais disposta a fornecer dados a familiares e a polícia.” Em 2016 a Uber era a única no segmento de transporte privado a manter seus dados sobre motoristas no sigilo. Outras como Cabify, EasyGo e 99POP forneciam seus dados para o governo em casos de investigações quanto a algum crime e afins. Isso abria uma vantagem da empresa quanto as suas concorrentes, por assegurar o sigilo de seus motoristas.

Marleide, que dirige profissionalmente a quase dois anos,, diz que nunca sofreu nenhum tipo de violência, mas que toma algumas medidas de segurança. Por exemplo, só faz corridas durante o dia e sempre avalia a nota do passageiro, se a nota for muito baixa ela cancela, como já aconteceu duas vezes. Ela não anda armada e corridas a noite só se forem marcadas com antecedência. “O aplicativo oferece proteção também, caso a gente se sinta ameaçada, no aplicativo pode acionar a polícia sem que o passageiro perceba” nos disse Marleide. Ela se refere a função do aplicativo “Ligar para a polícia”, onde o motorista em situações de risco ou emergência tem como compartilhar sua localização atual, através do GPS do aplicativo, com as autoridades que são responsáveis pelo número 190. Toda essa informação está disponível no site da Uber, junto com diversas outras sobre segurança.

Um caso citado por Marleide ocorreu em Florianópolis, capital de Santa Catarina. Um homem foi linchado por ter roubado um carro de um motorista de Uber. O caso ocorreu em setembro deste ano, segundo o OCP News Florianópolis, “nem a identidade do homem, nem as circunstâncias do fato foram confirmadas, mas relatos de pessoas que estavam no posto e que circulam em redes sociais dão conta de que ele roubou o carro, acabou perseguido por outros motoristas de aplicativo e, ao parar no posto para abastecer, teria sido cercado e agredido até a morte.” Esse assassinato provavelmente só ocorreu devido a grupos de WhatsApp que os motoristas formam para se informarem desse tipo de situação. Isso vai de encontro a nossa outra entrevistada.

Wilma Squeff, de 59 anos e motorista a um ano e meio na cidade de Tubarão, Santa Catarina, relata um outro tipo de problema. Ela diz que violência vinda de passageiros ela nunca sofreu, “são mais pessoas mal-educadas e mal-humoradas que a gente tem que engolir, mas a maioria é gente boa”. Porém, ela diz que os próprios motoristas da Uber são bem agressivos. “Eu sofri bullying num grupo (WhatsApp) de motoristas da Uber, me chamaram de ‘velha louca’, e eu nunca fui, sempre fui trabalhadora e fiz o mesmo serviço que eles, e talvez até melhor”.

Nenhum grupo de WhatsApp é oficialmente suportado ou incentivado pela Uber, mas todas as três motoristas falam sobre eles e que são grandes. A única ferramenta oficial envolvendo os dois aplicativos é uma parceria que a Uber vem tentando realizar. Segundo o site oficial, em um futuro próximo “os motoristas parceiros em alguns países podem receber suporte da Uber para cadastro e ativação por meio de uma conta verificada do WhatsApp”.

Wilma começou a dirigir profissionalmente porque não conseguiu emprego quando foi morar em Santa Catarina. O que ela mais lamenta na profissão em si é a falta da união por parte dos motoristas. “A maioria é gente boa, mas as vezes os próprios motoristas [homens] fazem violência com as motoristas mulheres.” Além do caso ocorrido com ela citado acima, ela não tinha nenhum exemplo de outra violência ocorrida nesses grupos, era algo geral. “E é uma pena não serem uma classe unida. Quem puder levar vantagem sobre o outro, leva. A maioria não se respeita”.

Nesses grupos de WhatsApp existem diversos tipos de códigos usados pelos motoristas. Por exemplo, Joyce Bitencourt nos contou que caso se sinta ameaçada durante uma corrida, ela vai no grupo dos motoristas e coloca um emoji de bandeira vermelha, assim os outros motoristas sabem que ela está em perigo ou em uma situação de emergência, assim o motorista mais próximo da localização dela tenta fornecer assistência.

Joyce tem 31 anos e é motorista de Uber (e outras formas de transporte privado) a quase um ano, em Tubarão, Santa Catarina. Começou a dirigir profissionalmente por causa da flexibilidade de horário que a profissão oferece, e diz nunca ter sofrido nenhum tipo de violência. Sobre medidas de segurança, “aceito a corrida no aplicativo e não tem muito o que fazer. A gente nunca sabe quem é bom e quem é mau e não posso levar nenhum tipo de arma no carro”.

Ela comenta sobre casos de motoristas que foram “passadinhos” (assédio), mas não quis entrar e detalhes e diz que não foi com ela nem com ninguém que ela conhecia. É uma questão velada entre a comunidade de motoristas por ter tão poucas motoristas mulheres e pelas medidas de segurança e principalmente assistência que o aplicativo oferece não serem perfeitas.

Apesar disso, vem ocorrido, por parte da empresa, intenções de mudanças. Neste segundo semestre de 2019 a Uber começou a testar no Brasil o “U-Elas”, uma função no aplicativo para que motoristas mulheres possam fazer corridas apenas para passageiras mulheres. A função está sendo testada nas cidades de Campinas (SP), Curitiba (PR) e Fortaleza (CE). É apenas uma opção que o aplicativo oferecerá, caso desativada as motoristas mulheres voltarão a receber corridas de passageiros homens.

Essa iniciativa faz parte do projeto “Mulheres na Direção”, anunciado pela Uber recentemente nesse ano. Acontece que os números de mulheres motoristas são alarmantemente baixos. Apenas 6% dos 600.000 motoristas da Uber no Brasil são mulheres. Essa medida foi tomada depois de uma pesquisa em parceria com o Banco Mundial em que 64% das entrevistadas disseram não começar na profissão por questões de segurança. Como é o caso da Marleide, que só faz corrida durante o dia por medo, postura bem diferente dos motoristas homens e que lhes dá uma vantagem financeira e profissional.

Nas três cidades em que o ‘U-Elas’ começou a ser testado, uma outra iniciativa do programa será a garantia de uma renda mínima entre R$1.500 e R$1.600 para as mulheres que começarem a dirigir, nas 100 primeiras viagens. Claudia Woods, diretora-executiva da Uber no Brasil, disse que a segurança na renda é um fator importante para que as mulheres consigam honrar suas contas no início da trajetória com a Uber.

Dichavando Ideias foi produzido por Fhillype Costa Higor Stork e William Andrades
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Direção de Reginaldo Osnildo

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